O Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu, em agosto de 2024, que é possível o registro no INPI de marcas contendo expressão de propaganda (Recurso Especial n. 2.105.557/RJ).
O Artigo 124, VII, da Lei de Propriedade Industrial (LPI), prevê o seguinte:
Art. 124. Não são registráveis como marca:
VII – sinal ou expressão empregada apenas como meio de propaganda;
Apesar da aparente contradição entre o entendimento do STJ e a legislação, a Decisão se mostra acertada e compatível não somente com a melhor doutrina sobre Propriedade Industrial, mas também com outros precedentes daquela Corte.
No Julgamento do caso em análise, o STJ entendeu que a existência de uma expressão de propaganda no conjunto de uma marca não tem o condão de, por si só, ensejar o indeferimento do pedido de registro pelo Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI).
O STJ destacou que a análise de viabilidade de registro de marca deve se atentar à integralidade da mesma, recaindo sobre todos os elementos do conjunto marcário (tais como imagem, expressões gráficas, demais expressões nominativas, jogo de cores e tipografia).
Ou seja, caso uma marca possua em seu conjunto uma expressão de propaganda, somada a demais elementos que lhe confiram suficiente distintividade e originalidade, a concessão do registro pelo INPI é medida que se impõe.
Evidente que, em se tratando de marca contendo APENAS expressão usada como propaganda, sem o acréscimo de outros elementos, há de ser indeferido seu pedido de registro.
A Decisão se coaduna à Teoria do Todo Indivisível, de origem francesa. De acordo com essa teoria, a percepção dos consumidores sobre uma marca é produzida por todos os elementos da mesma simultaneamente considerados. Desse modo, não há motivo para que a análise de viabilidade de registro de uma marca se adstrinja a apenas algum(ns) de seus elementos.
Sobre a aludida teoria, o jurista Lélio Denicoli Schmidt esclarece o seguinte (A Distintividade das Marcas: secondary meaning, vulgarização e teoria da distância):
Na marca complexa [aquela formada por mais de um elemento nominativo], os elementos isolados que a formam efetivamente perdem sua singularidade e se mesclam para compor um todo unitário, que os absorve e do qual não podem mais ser dissociados. Forja-se uma nova identidade. É por esta razão que se deve resistir à tentação de fragmentar sua análise em pequenas peças. (2013, edição eletrônica)
O STJ já demonstrou filiação à teoria supracitada em outras ocasiões, por exemplo, ao decidir que marcas que contenham expressões genéricas, de uso comum, possam ser registradas, apesar da vedação da LPI prevista em seu Artigo 124, VI (vide Agint no REsp n. 2.053.824/SE). No caso do exemplo, foi decidido que a existência de uma expressão genérica não deve ser analisada isoladamente, mas em conjunto com os demais elementos da marca, os quais, caso dotados de distintividade, permitem o registro da marca, ressalvado o ônus de surgirem outras marcas semelhantes em razão de sua natureza evocativa.
Em outra oportunidade, o STJ assim decidiu:
Não se pode fragmentar a análise da marca a ponto de quebrar sua unidade e a forma pela qual o público consumidor a percebe, sendo de rigor que se proceda a uma análise global do conjunto. (REsp 1.924.788/RJ)
No julgamento do REsp 2.105.557/RJ, de relatoria da Ministra Nancy Andrighi, verificou-se que a marca abordada, em que pese contenha expressão de propaganda, possui apresentação mista (expressões nominativas e figurativas simultaneamente), cuja identidade visual constituía sinal distintivo e original.
A jurisprudência pátria parece pacificada no tocante à necessidade de análise de todos os componentes marcários, principalmente em casos de marcas de apresentação mista. Nesse sentido, cabe destacar o entendimento exarado pelo Juízo da 31ª Vara Federal do Rio de Janeiro no julgamento dos autos n. 5022522-63.2020.4.02.5101, vejamos:
(…) em se tratando de marca mista, não há que se falar, por óbvio, na exclusividade de uso dos elementos nominativos isoladamente.
[…]
(…) a análise para a aplicação do dispositivo legal acima mencionado deve levar em consideração o conjunto marcário em sua integralidade. No caso em apreço, é possível observar que as características visuais da marca da autora lhe conferem suficiente distintividade no conjunto
Logo, verifica-se a coerência do STJ ao permitir o registro de marca contendo expressão de propaganda associada a demais elementos de identificação e distinção. Não se afigura razoável que o INPI indefira pedidos de registro de marca com base em um ponto isolado da expressão marcária, pois o público-alvo que terá contato com essa marca perceberá concomitantemente todos os seus sinais.